Você tem lá suas manias, e olha, eu gostei de cada uma, até das mais bizarras e estranhas. Todas as vezes que a gente ficava conversando nas escadas e corredores daquele colégio colonial eu pensava: "caramba, eu quero muito ele". E não era querer no sentido de "ter", de posse. Era querer no sentido de te conhecer mais a fundo, de sentir sua alma através de um beijo. Eu gostava daquelas bandas doidas de reggae que você ouvia e do esforço que você fazia pra ouvir meus rocks. Não almoçávamos juntos, mas eu sempre ficava te olhando de longe, pra ver se com as outras pessoas você também era tão ingênuo (no melhor sentido da palavra). E era.
Eu dividia meus biscoitos com você, enquanto você dividia suas piadas comigo. Você subia os morros me carregando nas costas, me dava lugar no ônibus e me ensinava golpes de judô. Suas histórias sempre me arrancavam uma gargalhada sincera, muitas vezes eu rolava no chão e começavam a escorrer lágrimas, tão engraçado você era. Quando andamos de mão dadas pela primeira vez e decidimos assumir o que acontecia entre nós, eu percebi que não seríamos um casal comum, como todos os outros que se agarravam pela quadra, pelo campo, pelos bancos e pelas árvores. Percebi que seríamos um casal de melhores amigos que se beijavam. Que tinham, acima de tudo, um companheirismo de dar inveja. E nós éramos um casal chiclete, porque quando estamos perto de quem gostamos, não sobra tempo pra enjoar.
Quando chegou a época da faculdade eu não sabia mais como seria sem essa nossa rotina de beijos de pasta de dente às 6 da manhã e abraços suados às 7 da noite. Mas deu certo. Apesar da pequena distância, você sempre me ligava no fim do dia. Você me contava de como estava sendo o seu dia, eu te contava da nota ruim que tirei na prova. Você me contava algo engraçado, eu soltava uma risada abafada no telefone. Você me contava uma curiosidade sobre a natureza, eu te contava um mistério da psique humana. Quando você voltava fim de semana, eu me sentia completa de novo. Você me abraçava sem eu perceber, eu deitava no seu peito. A gente escolhia filmes pra assistir e receitas pra fazermos juntos.
Mas, cá entre nós, eu gostei de cada jeito seu, de cada trejeito. Confesso que você me causava sensações estranhas, do tipo que eu não estava acostumava a sentir desde quando eu era uma garotinha que sonhava com o príncipe encantado. Sei lá! Seu jeito não era comum, que se encontra fácil, mesmo que, com você, venham junto todas as suas neuroses, seu lado lento, seu lado doce, seu lado paciente, seu lado carinhoso, seu lado relaxado, seu lado ‘‘não tô nem aí pra nada’’. Mas eu gostei de você, e eu nunca fui de gostar de nada.